Maio de 1965
Era Domingo, a viagem naquela solarenga manhã, entre a vila do Montijo e Sete Rios - Lisboa, decorria normalmente como de costume. Como tinha tempo e gostava de de fazer aquele trajecto, barco até ao Terreiro do Paço, onde normalmente ia tomar um café no Martinho da Arcada, aí apanhava o eléctrico que me levava até à praça do Chile, onde depois apanhava outro que me levava até Sete-Rios, Estrada de Benfica. havia trajectos para rápidos, tais como ir ao Rossio apanhar o metro, mas era aquele o meu preferido. Naquele dia o eléctrico no Martim Moniz trocou de guarda freio, o que provocou um pequeno atraso,então quando o eléctrico no Chile abrandou para seguir pela Morais Soares, seu destino era o Alto de São João, saltei com ele ainda em andamento, para atravessar a Praça do Chile para o outro lado, junto ao antigo Serviço de Assistência à Tuberculose, o outro eléctrico já estava a sair.
Foi tão rápido o cerco que me fizeram, que quase nem tive tempo de respirar, não conseguia compreender de onde tinham surgido tão rapidamente, tantos policias de arma em punho e apontadas na minha direcção, felizmente não perdi a calma. de entre eles saiu um graduado, com a sua pistola no coldre.
Começou o interrogatório, de onde vens? Para onde ias? já não perguntou para onde vais, foi para onde ias, enfim um sem número de perguntas, em pleno centro do antigo cruzamento dos eléctricos, na Praça do Chile, tardiamente lá veio a pergunta, o que fazes e tens com que te identificar? Pedi autorização, meti a mão ao bolso, tirei o cartão que me identificava, como funcionário público, do Ministério da Justiça, que lhe entreguei, não o devia ter entregue, mas sim mostrado, ele o mirou e remirou, virou e revirou, vezes sem conta, ordenou aos outros polícias que baixassem as armas, cumprimentou-me com uma continência e devolveu-me o cartão, prontificou-se ir uma carrinha levar-me ao destino, o que eu recusei, então com umas descabidas palavras, algumas delas sem sentido, pediu-me para subir a rua Manuel da Maia e na paragem seguinte apanhar o eléctrico. tanto eu como os que já estavam naquela paragem, estivemos a ser vigiados, pelo polícia que ele destacou para me seguir, mas do lado oposto da rua, como se de nada se tratasse, mas sempre visível, pelo menos até entrarmos para o eléctrico. dali para a frente tudo estava normal.
Só da parte da tarde, consegui saber que os estudantes tinham convocado concentração, mas não diziam onde, assim todos os locais possíveis para a concentração estavam policialmente vigiados
Rio de Mouro 30-10-2019 - Francisco Parreira
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