CONTO
CARROSSEL
DE PAIXÕES
Com o queixo assente nas palmas das mãos e os
cotovelos apoiados na mesa, Joselito é a
imagem do pensador profundo. Ou de um homem angustiado, uma situação não anula a outra. Entretanto no
bar, Aniceto estranha e interroga-se acerca do significado que pode ter a
posição do amigo. Sobressalta-o com uma
palmada nas costas e vai direito ao assunto.
Que
se passa, rapaz, pareces preocupado.
E
estou.
Problemas?
O
problema de ter de tomar una decisão difícl.
Para
já, vamos tomar um como.
Não
bebo alcoól.
Desde
quando?
Desde
ontem.
É
de homem. Que tomas então?
Pode
ser uma caipirinha.
Bem
pensado. Faço-te companhia.
Aniceto
pede as bebidas ao empregado do bar e apressa-se em saber que diabo preocupa o amigo.
Se
não quizeres conversa, calo-me já. Mas, enfim,talvez eu possa ajudar-te na decisão
que tenhas que tomar.
Não
podes. Terei de ser eu a optar entre a Matilde, a Luizinha e a Graça. Elas conheceram-se, estás a ver o que aconteceu?
Chegaram à fala, treco-lareco, uma a uma identificaram-me como o suposto futuro
marido.
As
três?
As
três. E encostaram-me à parede. Tenho de optar por uma só.
Manias
de mulheres. E qualquer delas está na disposição de ficar contigo, desde que em
exclusivo?
Todas.
E não é extraordinário?
Vê
o caso do Jacques, um tipo com aquele ar de galã de telenovela e ninguém lhe
pega.
Não
me fales no Jaques.
Porquê?
É o exemplo do sedutor perfeito mas não há mulher que se apaixone por ele. E
eu, magricela, meio vesgo, gago, e sou disputado por três mulheres de arregalar
os olhos. Faz sentido?
Não
muito
Quem
dera ao Jaques ver-se na minha situação. Que, aliás, é bem complicada.
Mas
complicada porquê, pá? Haverá uma que te agrade mais que as outras duas.
Tu
não entendes, Aniceto. O problema não é escolher uma, é perder as outra duas.
Cada uma delas tem os seus especiais encantos. Como poderei prescindir da voz
doce da Matilde? Ou da sensualidade perturbadora da Graça? Ou do humor e
ternura da Luizinha? São três amores e, optando, fico sempre a perder.
Concordo.
Perdes dois a um.
Imagina
a felicidade do Jaques se alguma delas o quizesse. E eu neste drama. Quem dera
que os atractivos de todas elas estivessem reunidos numa só. Seria fácil e perfeita a escolha.
Recosta-se,
eleva o olhar para o teto, bruscamente
debruça-se sobre a mesa, segura os pulsos do Aniceto e segreda com a voz
enrouquecida:
Só há uma, bem, bom amigo,igual à soma daquelas
três queridas.
Vá
lá, descobriste uma raridade. E quem é?
Posso
dizer, Aniceto?
Claro,
é alguém que eu conheça?
Perfeitamente.
Desculpa dizer-te, Aniceto, mas a única mulher que me seduz na totalidade é a
tua namorada.
A
Carla?
A
Carla. Sempre. Desde que tiveste a maldade de me a apresentar. Perdoa , meu
amigo, mas ninguém é dono e senhor dos
seus sentimentos. E confesso que te envejo por teres a Carla.
O
rosto de Aniceto não revela se ficou ofendido ou lisonjeado com a confissão
inesperada. Silencioso, passa as mãos repetidamente pela nuca e, por fim, diz:
Acontece
, Juselino, que a Carla já não é minha namorada.
Emoções
desencontradas desenham no rosto do outro. Primeiro de surpresa, depois a
animação de uma ideia que nunca lhe ocorrera:
Sendo
assim....quer dizer que eu posso agora ter esperança?
Aniceto
torna a passear as mãos pela nuca, bebe um trago e diz num murmurio:
Não
creio, Juselito. Ela trocou-me pelo Jaques.
Casais de mem martins
10/11/14
Sem comentários:
Enviar um comentário