segunda-feira, 10 de novembro de 2014


CONTO
CARROSSEL DE PAIXÕES
 Com o queixo assente nas palmas das mãos e os cotovelos apoiados na mesa,  Joselito é a imagem do pensador profundo. Ou de um homem angustiado,  uma situação não anula a outra. Entretanto no bar, Aniceto estranha e interroga-se acerca do significado que pode ter a posição do amigo.  Sobressalta-o com uma palmada nas costas e vai direito ao assunto.
Que se passa, rapaz, pareces preocupado.
E estou.
Problemas?
O problema de ter de tomar una decisão difícl.
Para já,  vamos tomar um como.
Não bebo alcoól.
Desde quando?
Desde ontem.
É de homem. Que tomas então?
Pode ser uma caipirinha.
Bem pensado. Faço-te companhia.
Aniceto pede as bebidas ao empregado do bar e apressa-se em saber que diabo  preocupa o amigo.
Se não quizeres conversa, calo-me já. Mas, enfim,talvez eu possa ajudar-te na decisão que tenhas que tomar.
Não podes. Terei de ser eu a optar entre a Matilde, a Luizinha e a Graça. Elas  conheceram-se, estás a ver o que aconteceu? Chegaram à fala, treco-lareco, uma a uma identificaram-me como o suposto futuro marido.
As três?
As três. E encostaram-me à parede. Tenho de optar por uma só.
Manias de mulheres. E qualquer delas está na disposição de ficar contigo, desde que em exclusivo?
Todas. E não é extraordinário?
Vê o caso do Jacques, um tipo com aquele ar de galã de telenovela e ninguém lhe pega.
Não me fales no Jaques.
Porquê? É o exemplo do sedutor perfeito mas não há mulher que se apaixone por ele. E eu, magricela, meio vesgo, gago, e sou disputado por três mulheres de arregalar os olhos. Faz sentido?
Não muito
Quem dera ao Jaques ver-se na minha situação. Que, aliás, é bem complicada.
Mas complicada porquê, pá? Haverá uma que te agrade mais que as outras duas.
Tu não entendes, Aniceto. O problema não é escolher uma, é perder as outra duas. Cada uma delas tem os seus especiais encantos. Como poderei prescindir da voz doce da Matilde? Ou da sensualidade perturbadora da Graça? Ou do humor e ternura da Luizinha? São três amores e, optando, fico sempre a perder.
Concordo. Perdes dois a um.
Imagina a felicidade do Jaques se alguma delas o quizesse. E eu neste drama. Quem dera que os atractivos de todas elas estivessem reunidos  numa só. Seria  fácil e perfeita a escolha.
Recosta-se, eleva o olhar para o teto,  bruscamente debruça-se sobre a mesa, segura os pulsos do Aniceto e segreda com a voz enrouquecida:
Só  há uma, bem, bom amigo,igual à soma daquelas três queridas.
Vá lá, descobriste uma raridade. E quem é?
Posso dizer, Aniceto?
Claro, é alguém que eu conheça?    
Perfeitamente. Desculpa dizer-te, Aniceto, mas a única mulher que me seduz na totalidade é a tua namorada.
A Carla?
A Carla. Sempre. Desde que tiveste a maldade de me a apresentar. Perdoa , meu amigo,  mas ninguém é dono e senhor dos seus sentimentos. E confesso que te envejo por teres a Carla.
O rosto de Aniceto não revela se ficou ofendido ou lisonjeado com a confissão inesperada. Silencioso, passa as mãos repetidamente pela nuca e, por fim, diz:
Acontece , Juselino, que a Carla já não é minha namorada.
Emoções desencontradas desenham no rosto do outro. Primeiro de surpresa, depois a animação de uma ideia que nunca lhe ocorrera:
Sendo assim....quer dizer que eu posso agora ter esperança?
Aniceto torna a passear as mãos pela nuca, bebe um trago e diz num murmurio:
Não creio, Juselito. Ela trocou-me pelo Jaques.
Casais de mem martins
10/11/14

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