O meu dia 25 de Abril de 1974
Naquela manhã de quinta-feira,
Ir trabalhar era normal,
Comboio e metro me levaram,
Até aquele tribunal,
Onde rol de testemunhas,
Naquele prazo final,
Eu devia entregar.
Aqueles extremosos soldados,
Comigo à porta a dialogar,
A entrada me barravam,
Nada podiam mudar,
A cumprir ordens estavam.
Foi na paragem em frente,
Que o autocarro ( carreira oito ) apanhei,
Sem qualquer obstrução,
Ao trabalho cheguei,
Na minha secção,
A saber fiquei,
Não havia solução.
Por militares revoltosos,
O aeroporto estava tomado,
Dali não ia partir,
Qualquer avião aparcado,
E saber-se lá para onde,
Seria então desviado,
O trafego ali esperado.
Sugeriu então a chefia,
Acatemos os conselhos,
Ouvidos na telefonia,
Vamos todos para casa,
Amanhã será outro dia.
A sair fui o primeiro,
Para a paragem corri,
Veio o quarenta e cinco,
Nesse mesmo eu subi,
Sem definido o destino,
Nas ruas já algum povo,
Que parecia sem tino.
Para-o-que-desse-e-viesse,
Os militares atentos,
Ferramenta do dia preparada,
Vigiavam pontos-chave e monumentos.
No Terreiro do Paço apeei,
Bastante era o povo ali,
Quantas centenas não sei,
Nem acreditar queria,
Naquilo que observei,
Era mesmo de terror,
O senário montado estava,
Em terra aquele canhão,
Sua mira apontava,
Àquele vaso de guerra,
Que no mar da palha navegava,
Os seus canhões exibia,
Naquela curta distância,
O alvo não falharia.
A quem prefere a paz à guerra,
Aquele senário desagradava.
Subi ao Largo do Carmo,
Ver como aquilo lá estava.
Em amena cavaqueira,
De tudo e muito lá se falava,
Com os militares presentes.
Ao ser noticiado,
Que doutor Marcelo Queitano,
Estava ali refugiado,
Nem meia hora passada,
O espaço estava lotado,
Bancos, estátuas e árvores,
De pináculos serviam,
Também palavras de ordem,
Já por ali se ouviam.
Nos carregadores as balas,
Nos canos cravos vermelhos se viam,
Para aquele quartel fronteiro,
Todos pontaria já faziam,
Manuseio de armas ligeiras e morteiro,
No telhado era visível,
Um senário dantesco e atroz,
Estava lá frente a frente,
À vista de todos nós,
Nada mais nos era dito,
Só se ouvia a nossa voz,
Numa desconexa gritaria.
De minha livre vontade,
Passo à frente passo atrás lá saía,
À António Maria Cardoso,
Ir também eu queria,
Espreitar aquelas janelas,
Era tanto o povo que havia,
Naquelas ruas e ruelas,
Era quase impossível,
Transitar nelas.
Desci então ao Rossio,
Onde errada ou certa,
Tomei uma decisão,
Com a mulher e o filho preocupado,
Dirigi-me à estação,
Os conselhos da rádio acatei,
O comboio estava normal,
Para casa regressei,
Naquele dia muito perdi,
Nem assisti a rendição,
Depois de em casa entrar,
Nos jornais, rádios ou televisão,
Vi o que me quiseram mostrar.PS – passado a limpo em2018
Francisco Parreira – 08-05-2018